O Risco do Intimista Apressado- Por André Luiz Santiago Eleutério

Foto de André Luiz Santiago Eleutério, autor do Pensamento Diário com reflexões emocionais sobre a vida
André Luiz Santiago Eleutério

Certos tipos de comentários, que implicam em muita intimidade, precisam avançar paulatinamente. Isso não é apenas uma recomendação de etiqueta social; é um grito de socorro da civilização. Porque nada fere mais a harmonia entre seres humanos do que a ousadia do íntimo instantâneo aquele espécime que acredita que uma conversa de dez minutos dá direito a confidências dignas de um diário trancado a chave. Vivemos uma era em que o pudor verbal foi substituído por uma espécie de libertinagem comunicativa. As pessoas confundem espontaneidade com licença para invadir. O sujeito mal aprende seu nome e, em menos de cinco minutos, já pergunta sobre traumas de infância, ex-relacionamentos ou o motivo pelo qual você parece tão cansado da vida. Um comentário desses deveria vir com bula: “Uso indevido pode causar constrangimento crônico e vontade de desaparecer.”

A pressa da intimidade é um sintoma moderno. Talvez seja o subproduto da ansiedade digital, onde todo mundo se acha autorizado a comentar tudo inclusive o que não lhe diz respeito. É a cultura da opinião travestida de afeto: o elogio invasivo, o conselho não solicitado, o diagnóstico emocional de balcão. Um desfile de excessos travestidos de cuidado.

Mas a verdadeira elegância está em entender o ritmo do outro. Intimidade é como um vinho: precisa respirar. Quem chega com sede demais acaba provando vinagre. Há uma delicadeza intrínseca em respeitar o espaço alheio, um charme sutil em saber calar na hora certa. A conversa, afinal, é uma dança e não uma luta livre.

O humor negro da situação é que muitos desses invasores acreditam sinceramente estar sendo gentis. Acham que abrir o coração é sinônimo de empatia. Quando, na verdade, é só carência mal disfarçada. O mundo moderno sofre de um transtorno coletivo: a necessidade patológica de ser íntimo de todos, imediatamente. Uma pressa afetiva que transforma qualquer encontro casual em sessão de terapia gratuita e involuntária.

O curioso é que, quanto mais íntimos se tornam os comentários, mais distantes ficamos das pessoas. É o paradoxo da convivência contemporânea: quanto mais se fala, menos se entende. A sutileza virou artigo de luxo. Saber medir palavras, hoje, é quase um gesto revolucionário.

Portanto, se há uma regra de ouro nas relações humanas, ela é simples: avance com elegância, retroceda com graça, cale-se com estilo. A intimidade verdadeira floresce no terreno da paciência e não na pressa dos curiosos.

E se, por acaso, alguém lhe disser algo íntimo demais cedo demais, sorria. Depois, guarde o comentário no mesmo lugar onde ficam as senhas esquecidas e as promessas de Ano Novo: naquela parte da mente dedicada ao esquecimento elegante.

Porque, no fim das contas, a boa convivência é uma arte. E como toda arte refinada, exige tempo, distância e sobretudo um certo desprezo educado pela inconveniência alheia.

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